sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

O Pensamento Matemático - Parte 4

Acabou que falei sobre um monte de coisa no último post, mas não resolvi nada. Espero que quem tenha me acompanhado durante essa pequena jornada tenha percebido que fazer as coisas de modo inteligente vale a pena. E é com essa nova percepção que vamos continuar caminhando até o fim. Vamos acabar com esse problema! Somos seres inteligentes, nada pode nos dar medo, nenhum desafio é muito para nós, não existe nenhuma pedra, nenhuma montanha que seja uma barreira intransponível para nós! Nada pode nos deter!!!

No último post eu disse que se um lado da balança tem mais pérolas então ele vai ser mais pesado, não importa que arrumação de pedras eu faça, sempre vai ser assim. Essa descoberta é ótima, mas e pra que isso nos serve? Acompanha o raciocínio: se tivermos uma situação onde um lado tem mais pérolas que outro, então a pérola mais leve pode estar em qualquer lado que não faz diferença, o lado com mais pérolas vai descer mais. Isso quer dizer que nesse tipo de situação não conseguimos descobrir nada sobre onde está a pérola mais leve.

Maravilha! Eureca! Genial!!!

Se esse tipo de situação não nos ajuda em nada, o que nos sobra? Exato! O que nos sobra é analisar as situações quando os dois lados tem o mesmo número de pérolas. Quem chegou até aqui meus parabéns! Você passou por diversos vales sombrios, vilas amaldiçoadas e bestas infernais, mas você superou todos esses obstáculos e chegou até o reino da luz, onde a Verdade lhe foi dita, e onde você pôde beber do cálice da sabedoria.
Mas isso quer dizer que a jornada acabou? Claro que não! Essa foi apenas a primeira fase, foi a fase mais difícil, mas ainda tem mais...

Se o que temos que fazer é comparar quantidades iguais de pérolas, então é isso que faremos. Nossas opções são: uma pedra de cada lado, duas pedras de cada lado e três pedras de cada lado. ( quem foi que disse quatro de cada lado?! )

PS: quando eu falar de restante das pérolas, estou falando das pérolas que estão de fora, as que não estão na pesagem.

1) Uma pérola em cada lado:


Se tivermos uma pérola de mesmo peso em cada lado, a mais está leve entre as cinco restantes.



Se a pérola mais leve estiver em um dos lados, então ela está no lado mais alto, aqui o problema foi resolvido, a pérola mais leve foi achada em apenas uma pesagem.

2) Duas pérolas em cada lado:


Se tivermos duas pérolas de mesmo peso em cada lado, então a pérola mais leve está entre as três restantes.



Se a pérola mais leve está em um dos lados, então ela está no lado mais alto e é uma das duas que está nesse lado.


3) Três pérolas em cada lado:



Se tivermos três pérolas de mesmo peso em cada lado, então a pérola mais leve é a única restante, e assim o problema está resolvido com apenas uma pesagem.



Se a pérola mais leve está em um dos lados, então ela está no lado mais alto e é uma das três que está nesse lado.


Estamos quase lá, o que precisamos fazer agora é descobrir qual dessas escolhas vai nos levar ao sucesso. Vamos analisar uma por uma, de uma vez por todas. Nas análises abaixo, aconselho que enquanto você for ir lendo, volte aos desenhos acima para ter uma boa idéia do que está acontecendo.

1) Uma pérola em cada lado:

-> Se os lados não equilibrarem, já sabemos que a mais leve está no lado mais alto.
Mas e se equilibrarem? Então teremos apenas uma pesagem para cinco pérolas, e como já sabemos, temos que colocar uma quantidade igual de pérolas em cada lado. Se colocarmos uma em cada lado e equilibrarem, quer dizer que mais leve está entre as três restantes, e não temos como saber qual é. Isso quer dizer que precisamos colocar duas em cada lado, mas se não equilibrarem, quer dizer que a pérola mais leve está no lado mais alto, onde tem duas pérolas, e nesse caso não sabemos qual das duas é a mais leve. Chegamos perto, mas não foi agora.
O que eu acabei de mostrar, é que existe um modo de se chegar à um caminho incerto quando se começa colocando uma pedra de cada lado, e como procuramos uma certeza, não podemos ir por esse caminho. Conclusão: colocar uma pedra de cada lado na primeira pesagem pode não dar certo, então não vamos fazer isso.

2) Duas pérolas em cada lado:

-> Se os lados não equilibrarem, sabemos que a pérola mais leve está no lado mais alto, onde tem duas pérolas. Então na próxima pesagem colocamos essas duas, uma em cada lado, e o lado mais alto é onde está a pérola mais leve, e assim o problema foi resolvido.
Mas e se equilibrarem? Então sabemos que a pérola mais leve está entre as três restantes, e temos que descobrir qual é ela, com apenas uma pesagem. Para fazer isso escolhemos duas para pesar, colocamos uma em cada lado, se equilibrar, então a restante é a mais leve, se não equilibrar, então a pérola mais leve está no lado mais alto, de qualquer maneira conseguimos encontrar a pérola mais leve. Conclusão: colocando duas pedras em cada lado no início nos leva a descobrir com total certeza qual é a pérola mais leve.

Então o problema está resolvido, duas pedras de cada lado é o que precisamos fazer. Agora já podemos dormir em paz. ^^

.........

Hmmm? Alguém disse algo? Se você sente que tem algo faltando, então pode ser que você tenha o espírito matemático dentro de você. Muitos se satisfazem só com a solução, mas o espírito matemático não quer só a solução, ele quer examinar o problema por completo. Não vamos parar por aqui, afinal, e se colocarmos três pedras de cada lado, o que acontece?

EXTRA:

3) Três pérolas em cada lado:

-> Se os lados equilibrarem é fácil, a pérola mais leve é a restante.
Mas e se não equilibrarem? Então sabemos que a pérola mais leve está entre as três no lado mais alto. Na próxima pesagem temos exatamente o mesmo caso para duas pérolas de cada lado, a segunda pesagem, quando a primeira pesagem ficou equilibrada. Conclusão: com três pérolas de cada lado também conseguimos com total certeza resolver o problema!



Foi uma longa jornada, desde a explicação do problema, do modo como funciona o pensamento matemático, passando por uma análise minuciosa das possibilidades, das filtragens, até chegar em um ponto onde teríamos que analisar apenas três casos com um número igual de pérolas em cada lado. Mas se você me acompanhou com calma, refletindo, se esforçando, sei que você conseguiu ir até o fim da jornada, e no fim desta jornada, aprendemos um pouco sobre como nossas mentes fazem coisas incríveis, e como nós mesmos conseguimos fazer coisas incríveis quando estamos dispostos.

Esse problema que passei aqui pode ser resolvido por muitas pessoas em alguns segundos, e muitas pessoas que o resolvem nesse tempo não fazem nem idéia de quanta coisa sua mente faz no processo de resolvê-lo, mas agora nós sabemos.
Acredito que sabendo um pouco sobre cada obstáculo que estamos superando, valorizamos o ato de pensar, o ato de raciocinar. Valorizamos um dos maiores dons que Deus nos deu: a inteligência.

O Pensamento Matemático - Parte 3

Agora temos apenas 33 casos para analisar na primeira pesagem, e isso pode ser feito "na força bruta", quero dizer, a pessoa pode fazer um caso de cada vez e ir vendo quais deles são bons e quais não são. A força bruta de fato é usada muitas vezes para resolver diversos problemas na matemática, e não apenas na matemática, mas em diversas áreas. Mas a força bruta está longe de ser um modo inteligente de resolver as coisas, isso porque ela resolve as coisas do modo mais lento possível e porque não se exige muito raciocínio elaborado para usá-la. Quando nós usamos a inteligência, nós somos capazes de entender e descobrir atalhos para a solução de algum problema, foi usando a inteligência que chegamos a 33 casos para analisar quando originalmente se tem 5040 casos, imagine fazer os 5040 casos um por um, isso seria usar a força bruta, pouca inteligência e muito esforço.

Então a partir de agora vamos fazer um pacto, vamos sempre procurar resolver as coisas do modo mais inteligente que pudermos, se você fizer isso, já está dando um passo importante na sua vida, seja como matemático ou não.

De qualquer maneira, como vamos resolver esse problema com a inteligência? O que podemos fazer agora? Aquelas filtragens que eu disse antes eram bem legais, mas elas não filtraram tudo, e agora parece que está bem difícil ver algo para ser filtrado, mas de fato ainda existe mais uma coisa. Essa última filtragem que é a filtragem mágica, ela é que traz à tona o que é um pensamento inteligente, um pensamento elegante. Acredite, existe beleza nos pensamentos, não é só em música, pintura, etc. Na verdade, pois mais que seja difícil de acreditar, existe criatividade em matemática, e ela de fato pode ser vista como um tipo de arte.
Para começar, dê uma olhada no desenho abaixo:




Nesse desenho eu comparei a pesagem de 4 pérolas com todas as que estão abaixo de 4. E aqui deu pra constatar que o lado onde tem 4 pérolas sempre é mais pesado. Se eu tivesse comparado um lado com 3 pérolas e o outro com menos de 3, também ia dar que o lado de 3 sempre estaria mais pesado. Já deu pra ver aonde quero chegar?
Eu não vou fazer todos os casos, mas o que quero mostrar é que se você colocar mais pedras de um lado, esse lado vai ser mais pesado, não importa se a pedra mais leve está ali ou não. Parece óbvio demais? Pode ser que sim, agora que foi dito. Mas antes de ser dito, não era óbvio, e a questão toda é essa: conseguir enxergar esse tipo de coisa óbvia. Se pra alguém ainda não está claro, vou explicar o porquê.

Se no lado direito temos n+1 pérolas, no lado esquerdo temos no máximo n pérolas ( tem que ser assim porque o lado direito tem que ter mais pérolas que o esquerdo ). Eu disse antes que o lado que tem mais pérolas sempre é mais pesado que o outro lado, então vou forçar um pouco a barra e colocar a pérola mais leve do lado direito pra ver se consigo fazer o esquerdo passar. Um desenho disso seria algo assim:



Acontece que as n pérolas de cada lado se igualam, e no lado direito entra a mais leve, e acaba que ele fica um pouco mais pesado. Como eu fiz o máximo possível pro esquerdo passar o direito e não consegui, é porque não tem como mesmo, sempre que um lado tiver mais pedras ele vai ficar mais pesado que o outro.

Às vezes muitas coisas óbvias passam sem ninguém percebê-las, até matemáticos podem deixar coisas simples passar sem percebê-las. O segredo para você conseguir perceber melhor essas coisas é simples: prática, prática e prática. Coloque a cabeça pra funcionar, procure resolver qualquer problema da sua vida de modo inteligente, procure resolver enigmas, sudoku, palavras cruzadas, enfim, pratique atividades mentais diversas. E se você quer ficar bom em alguma área em particular, pratique bastante coisas ligadas à essa área. Não existem barreiras intransponíveis, não existe inferioridade mental, nem ninguém está destinado a ser burro. Quem quer ficar bom em alguma coisa, tem que acreditar que pode, e correr atrás.

Nossa! Mas isso não é uma coisa tão óbvia? Acho que não estou falando nenhum segredo aqui, todo mundo sabe que quem quer algo tem que acreditar e correr atrás. Então, se alguém acha que é incapaz, pode ir parando por aí, porque não é. Afinal, se você fosse incapaz, teu cérebro não ia reduzir 5040 possibilidades pra 33. A verdade é que todos nós temos um instinto matemático, nós nascemos com isso, e quem quiser pode desenvolver, em outras palavras, não é questão de poder ou não, é questão de querer ou não.